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9.8.2

5.

Pela calçada um homem caminha em direção à Mansão Halliwell. De tempos em tempos ele pára e confere o endereço que traz anotado num pedaço de papel, até chegar exatamente na frente da casa.

Ele parece ter mais de 60 anos de idade e está bem acima do peso. Mesmo assim sobe com agilidade as escadarias, pulando degraus de dois em dois.

Piper ouve o barulho da campainha e, ao atender, encontra a figura sorridente.

- “Rua Prescott 1329, é aqui?”

Aborrecida, ela aponta para o número bem ao lado da porta da casa.

- “Ho, ho, claro que é!”, continua o homem, sem se deixar afetar pelo aparente mau humor da anfitriã. “E você deve ser Piper...é exatamente como a Guilhermina descreveu!”

- “O senhor é o eletricista que ela ficou de mandar?”

- “Sim, deixe-me apresentar: sou Nikolaus de Izmir, o faz-tudo mais famoso do Mundo Mágico. E nas horas vagas também sou eletricista.”

Sem esperar convite, o velhinho se espreme entre Piper e a porta e vai entrando até a sala da casa.

- “Mas que linda árvore de Natal! Foi montada com sensibilidade, logo se vê... a senhora tem muito bom gosto!”

Piper olha para o alto e suspira, como quem pede paciência aos céus.

- “Poupe seus elogios, não fui eu que montei. É coisa da minha irmã mais nova. Por mim, nem teria essa árvore aqui.”

Nikolaus faz uma cara de espanto.

- “Mas por que alguém não iria querer uma árvore de Natal?”

- “Porque simplesmente o Natal não significa nada para mim. Agora, se o senhor não se importa, a caixa de luz fica por aqui!” dispara Piper, quase empurrando o velhinho até a cozinha.

- “Então, aqui é o problema? Conte-me o que aconteceu.”

- “As tomadas da sala simplesmente pararam de funcionar. Eu não sei por que, não houve nada de diferente! Meu marido é bom em consertos, ele verificou tudo, e não encontrou nenhum problema na fiação.”

Nikolaus coloca a caixa de ferramentas sobre uma mesa e começa a tirar chaves de fenda e outros apetrechos.

- “Bem, eu vou verificar mais vou precisar da sua ajuda. Fique por perto e, quando eu chamar, você vai me ajudar a fazer os testes, ok?”

Piper solta mais um suspiro. Pensa em Leo sozinho no restaurante lotado, mas não há o que fazer. Melhor resolver um problema de cada vez.

6.

Um pequeno córrego segue pelas pedras até formar um laguinho calmo, numa parte mais aberta da caverna. A água é tão tranqüila que, apesar da quase escuridão, ali se pode ver o reflexo do próprio rosto como num espelho. Atividade que tem se tornado quase um ritual para a mulher que se aproxima e se ajoelha na beira do lago.

Ela segura os longos cabelos negros e se inclina. Aos poucos, sua imagem vai aparecendo na água. É Prudence Halliwell.

“Ainda estou igual... eu não mudei, desde o dia em que morri”, pensa Prue.

No Limbo, o lugar onde ela escolheu ficar é vazio e solitário. Não há absolutamente nada para fazer além de andar de um canto para o outro e pensar. Prue não quer ficar entre os outros espíritos: muitos são raivosos e revoltados, além de haver uma infinidade de demônios banidos pelas Encantadas que ela certamente não deseja encontrar.

Em suas longas meditações, ela vê o passado como um filme. Nada parece ter sido real.

“Orgulho, sempre o orgulho”, pensa Prue, sentando-se numa antiga cadeira de madeira entalhada. “Acho que foi por aí que o mal entrou. Sempre culpei minhas irmãs por não ser insubstituível, por elas terem conseguido seguir em frente sem mim...”

Assim perdida em pensamentos, ela não percebe o barulho de passos muito leves que se aproximam. Só quando alguns seixos rolam, no chão, Prue é alertada de que não está sozinha.

- “Quem está ai, apareça!”, grita.

Num dos cantos da caverna, a silueta de uma criança se aproxima.

- “Eu... acho que me perdi. Nunca tinha vindo antes para esses lados.”

É uma menina, que não parece ter mais que dez anos de idade. Prue, que aprendeu a não confiar nas aparências, se afasta e fica em guarda para um possível ataque.

- “Quem é você e como veio parar aqui?”

- “Meu nome é Hope. Eu ouvi falar que esse lugar existia, mas nunca tinha vindo aqui. É bonito, mas é frio.”

- “Não se aproxime mais!” ordena Prue.

- “Não precisa ter tanto medo! Não sou nenhum dos demônios que você baniu.”

- “Como sabe disso?”

- “Ora, todos no Limbo sabem que uma Encantada mora aqui. É por isso que eu vim: queria conhecer você.”

Hope continua se aproximando de Prue.

- “Se quisessem te atacar eles já teriam vindo. Mas estamos no Limbo. Não faz sentido atacar ninguém aqui.”

- “Por que não faria? Vi espíritos maus e revoltados por todas as partes!”

- “O máximo que eles podem fazer é mal para si mesmos” diz Hope, dando de ombros. “Aqui ninguém tem poderes... aliás, ninguém tem poder sobre nada.”

Intrigada, Prue baixa um pouco a guarda.

- “Mas como pode uma criança estar aqui?”

- “Bem, esse não é o Inferno... é o Limbo! Há muitas crianças. Eu mesma, estou aqui desde sempre...”

Segue-se um longo silêncio. Prue começa pensar sobre o seu destino, que parece ser igual ao da menina: ficar por toda eternidade naquele lugar.

- “Como você fez... para agüentar esses anos todos?”, ela pergunta.

- “Bem, há muitas pessoas interessantes para se conversar por aqui! Você saberia disso, se não vivesse isolada nesse canto. Eu já conheci príncipes e princesas, navegadores espanhóis das antigas caravelas, magnatas do petróleo, atores, cientistas... todo o tipo de gente.”

Prue sente uma grande tristeza. Por mais que essas pessoas sejam interessantes, ela não se sente animada com a possibilidade de conhecer gente nova no Limbo.

- “Eu sei que para você isso não parece bom o bastante. Mas é normal sentir o que está sentindo. Muita gente passa os primeiros tempos apenas meditando, assim como você”, diz Hope, como se pudesse ler seus pensamentos.

- “É que eu gostaria de entender o sentido disso tudo: o que me aconteceu, por que vim parar aqui... me arrependo tanto do que fiz! Se ao menos eu pudesse reparar...”

- “A primeira coisa é deixar essa onipotência de lado, e parar de lutar contra o que não pode mudar. O que passou, passou. Você está no Limbo para aprender que não tem mais domínio sobre sua vida mortal.”

Prue se espanta com a capacidade que a menina tem de entender tudo o que está acontecendo com ela.

- “Venha”, continua Hope, pegando Prue pela mão. “Tenho algumas coisas para te mostrar que podem ajudar você a entender melhor do que eu estou falando.”

Sem mais medo, Prue deixa-se levar pela criança para fora da caverna onde se escondia. Para espanto seu, a paisagem é linda: há longos campos verdes, penhascos majestosos, imensos jardins floridos. Ela não lembrava de ter visto nada daquilo ao chegar, e fica pensando em quanto tempo perdeu dentro daquela caverna.

7.

Anoitece em San Francisco. Piper espia pela janela da cozinha, e se preocupa. O movimento tem sido intenso no restaurante nos últimos dias, e ela não está lá para ajudar.

Na frente da caixa de luz, um Nikolaus com cara de preocupado mexe hora num fio, hora num disjuntor...e nada. Não há sinais de que a energia vá voltar às tomadas da sala.

- “Ufff! Eu já tentei tudo que podia! Dona Piper, tenho que lhe confessar que o problema é maior do que eu pensava.”

- “Esqueça do ‘dona’, Nikolaus. Venha, venha tomar um suco que eu preparei.”


Piper serve ao eletricista um grande copo de suco com biscoitos.

- “Hummm, que deliciosos! Exatamente como eu gosto! Onde você os comprou?”

O elogio finalmente faz surgir um sorriso no rosto de Piper.

- “Esses fui eu mesma que fiz. Às vezes gosto de assar biscoitos, apenas para me distrair.”

- “Não entendo como alguém que prepara biscoitos tão deliciosos possa não gostar de árvores de Natal!”

- “Não vejo o que uma coisa tenha a ver com a outra.”

- “Ora, uma boa cozinheira tem que ter, antes de tudo, muita fé e sensibilidade! Ninguém prepara a massa de um bolo sem a esperança de que ele vá crescer e ficar fofinho. Não se pode temperar um peru assado sem sensibilidade para a exata quantidade de sal e de ervas finas! Cozinhar é... é como iluminar uma sala! Você pega algo que não era nada, que estava cru e sem gosto, e transforma numa coisa bonita e agradável! Você pega um dia qualquer da sua vida, monta uma linda árvore de Natal, e aquele passa a ser um dia de alegria, um dia especial!”

Piper arregala os olhos: esse velhinho deve estar delirado!

- “Venha, Piper, vamos até a sala. Acho que descobri o que há de errado com as suas tomadas!”

Relutante, ela segue o eletricista. A sala está às escuras, pois o lustre também não funciona. Mas estranhamente, os enfeites da árvore brilham como se estivessem sob a luz.

- “Veja a árvore que a sua irmã montou! Está brilhando!”

- “Eu não vejo nada disso.”

- “Como pode não ver? Oh, minha querida, você está correndo um grande perigo!”

Piper se irrita com tanta conversa fiada.

- “Olha, o que o senhor está dizendo não faz sentido para mim. Só sei que perdi a tarde inteira e a sala ainda não tem energia!”

- “VOCÊ é que não tem energia, querida! Você não tem mais fé! O que está acontecendo na sala logo vai acontecer na casa inteira, e na sua vida inteira, pois a luz se vai quando se perde a esperança!”

- “O senhor está querendo dizer que as tomadas não funcionam por MINHA culpa?”

- “Mas é óbvio! Você é uma bruxa! Não pode simplesmente se recusar a ver a magia que está em todas as coisas!”

A essa altura da conversa, Piper já está furiosa.

- “Nikolaus, você pode ser o melhor faz-tudo do mundo mágico, mas não sabe consertar tomadas! Obrigada pelos seus serviços, pode pegar as suas coisas, eu vou chamar outra pessoa!”

- “Meus serviços ainda não terminaram! Na verdade, estão apenas começando...”

Dizendo isso, Nikolaus coloca a mão no bolso e tira uma caixinha muito pequena, toda vermelha. Ele a abre e assopra o conteúdo, um pó dourado e brilhoso que se espalha da cabeça aos pés de Piper.

- “Atchim!”

- “Para que possamos continuar, preciso que você volte a ter a inocência em seus olhos!”, ele diz.

Piper olha para a árvore de Natal e se surpreende. Lá está o forte brilho que não havia visto antes. Então, percebe que a árvore parece bem mais alta do que era. Ela corre para um espelho, mas não consegue se enxergar.

Piper sobre numa cadeira, e descobre porque está tão pequena: o pó de Nikolaus a fez virar criança novamente.


8.
- “Venha, Prue! Você está ficando para trás!”

A subida é íngreme entre a mata fechada, mas a menina parece ignorar isso enquanto Prue vence a distância entre as duas com dificuldades.

- “Vá mais devagar, não estou conseguindo acompanhar você!”

Hope volta e novamente pega Prue pela mão.

- “Agora falta pouco.”

De repente, a mata se abre e se transforma num gramado macio de pisar. Prue percebe que estão num lugar muito alto, e a paisagem é linda.

- “Que lugar bonito!”

- “Você não viu nada ainda! Vamos caminhar um pouco mais.”

Prue segue Hope e percebe que estão no alto de um grande penhasco, que forma uma fenda repentina e muito profunda. Para baixo há um paredão de pedras cheio de vegetação colorida. Árvores floridas e muitos pássaros se penduram pelas paredes do precipício.

O céu azul e limpo permite ver que aquela fenda segue indefinidamente até onde os olhos alcançam o horizonte. A paisagem é de uma grandeza indescritível.

- “Vamos mais perto”, chama Hope.

- “Eu... tenho medo de altura!”

A menina solta uma gargalhada.

- “E o que pode te acontecer, cair e morrer? Hora, você já está morta! Vai ter medo por quê?”

Prue toma fôlego e dá mais uns passos. Só então consegue ver uma imensa cachoeira que despenca paredão abaixo, formando uma névoa de água e um arco-íris.

- “É lindo!..”

- “Chamamos este lugar de Fonte do Bem. Ele foi criado no princípio da vida, pelo Espírito acima de nós. A partir daqui, todo o Universo cresce e se expande. Veja!”

A menina aponta para o centro da cachoeira. Prue percebe que há um ponto de luz muito brilhante, de onde na verdade a água parece brotar.

- “Daqui flui a luz para todo aquele que está no caminho de evolução. Assim como é em cima, é embaixo, e por isso os Sábios só praticam o Bem: o Mal nada mais é do que ignorância.”

Prue fecha os olhos e medita por alguns segundos. A brisa fresca toca o seu rosto, e uma sensação de bem-estar que há muito não conhecia toma conta de todo seu corpo.

Longe dali, Piper olha fixamente para o próprio rosto no espelho.

- “Nikolaus, o que você fez comigo????”

- “Oh, não se preocupe, minha querida! Considere que esta é apenas a ‘roupa especial’ que você vai usar num passeio.”

- “Pois eu não quero passear, quero voltar ao normal agora mesmo!”

- “Ho, Ho, bem que a Mina me preveniu que você era cabeça dura!”

Piper fica ainda mais indignada. Então é isso que a babá pensa dela?

- “Venha, deixe eu te mostrar uma coisa.”

Nikolaus segura a mão de Piper e, imediatamente, os dois são transportados para uma espécie de nuvem, como se fossem anjos.

- “Confortável? A partir de agora, essa será a nossa carruagem!”

Nos céus, os dois viajam no tempo e no espaço, até chegarem a um imenso campo de trigo. As espigas que brotam da terra são levemente agitadas pelo vento, formando pequenas ondulações.

- “O Planeta em que habitamos é cheio de maravilhas... os antigos gregos acreditavam numa Deusa-mãe da Terra, chamada Deméter, que proporcionava colheitas fartas como esta. Se você gosta assar biscoitos, deve agradecer à Deméter pela dádiva do trigo!”

A paisagem muda bruscamente. A pequena Piper leva um susto: agora, estão em cima de um vulcão.

- “O fogo pode parecer assustador, não é? Mas é aqui que surge a matéria-prima de toda a Terra!”

A paisagem muda novamente, e eles flutuam sobre o oceano.

- “Mas a vida só é possível porque existe Água. Veja: o Sol está batendo na superfície e fazendo com que ela evapore, formando o Ar. Piper, você percebe como no mundo uma coisa depende da outra?”

- “Nikolaus, eu não sei quem você é, nem porque está fazendo isso comigo...”

- “Piper, você agora é uma criança... feche os olhos e tente se lembrar de quando sua mente ainda era a morada da fantasia! Respire fundo...”

Piper obedece.

- “Agora preste atenção em quantas vozes estão tagarelando dentro de você: a empresária pensando em seus problemas, a mãe pensando em suas responsabilidades, a dona de casa lembrando do que precisa consertar... e onde está a Piper verdadeira nisso tudo?”

Piper solta um grande suspiro.

- “Agora, faça com que elas se calem! Faça com que adormeçam. Apenas você, a Piper criança, vai ficar acordada, de olhos bem abertos para as maravilhas do mundo!”

Piper reabre os olhos e está transformada. Agora, realmente se sente criança de novo.


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